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Peixe-boi: um dócil animal ameaçado

Atualizado: 6 de jul. de 2021

Autores: Mariana P. Haueisen, Raphaela A. Duarte Silveira, Thais R. Semprebom e Douglas F. Peiró

Imagem de um peixe-boi nadando no fundo do mar com vários peixes ao seu redor.

Os peixes-boi contribuem para a manutenção do ecossistema aquático. Fonte: PublicDomainImages/Pixabay (Domínio Público).



Os peixes-boi são mamíferos placentários de grande porte, totalmente aquáticos, com adaptações específicas à vida aquática, como a internalização do pavimento auricular e dos órgãos genitais, o que diminui o atrito com a água. Existem espécies de água doce e espécies marinhas. Não possuem predadores naturais e são bioindicadores da presença de contaminantes ou patógenos.


São animais que vivem solitários ou em pequenos grupos, o que pode dificultar o encontro com um parceiro para se reproduzirem. Isso contribui para a redução do número de indivíduos, aumentando o risco de extinção. Além disso, pode não favorecer uma alta variabilidade genética, a qual é importante para os seres vivos por possibilitar a adaptação dos mesmos ao meio.


Peixes-boi vivem em águas calmas e rasas, pois é onde encontram com maior facilidade seus recursos alimentares. Os peixes-boi marinhos suportam grandes variações de salinidade, mas os filhotes nascem em estuários, portanto, os manguezais são também importantes para a conservação da espécie.


Todos as espécies de peixes-boi possuem cuidado parental, sendo a gestação do filhote de um ano, dois anos de amamentação e mais um ano de cuidados extras. Devido a esta atenção ao filhote, uma nova gestação poderá acontecer em cerca de 4 anos. Sendo assim, possuem de uma reprodução muito lenta, com uma taxa reprodutiva muito baixa, o que contribui com a demora para a recuperação das espécies ameaçadas.



Figura do manguezal com várias árvores tipicas desse local alagadas.

Manguezal: potencial local de berçário e alimentação de peixes-boi. Fonte: claritus1/Pixabay (Domínio Público).



Os peixes-boi são animais herbívoros, sendo o capim-agulha, algas e folhas de mangue constantemente presentes na sua dieta. Ingerem alimentos equivalentes a 5-11% do seu peso por dia e permanecem por até oito horas se alimentando diariamente! Apresentam muitas vibrissas no focinho e na região da mandíbula. As vibrissas têm função sensitiva e mecânica, auxiliando os lábios preênseis na manipulação do alimento.


Os peixes-boi pertencem à ordem Sirenia, que é dividida em duas famílias: Dugongidae e Trichechidae. O Dugong dugon (dugongo) é o único representante de Dugongidae vivente, pois o Hidrodamalis gigas (vaca-marinha-de-Steller) foi extinto em 1768. Os representantes da família Trichechidae são: Trichechus senegalensis (peixe-boi africano), T. inunguis (peixe-boi amazônico) e T. manatus (peixe-boi marinho). T. manatus apresenta duas subespécies: T. manatus latirostris (peixe-boi-da-Flórida) e T. manatus manatus (peixe-boi-das-Antilhas).


Figura mostrando um dugongo com o focinho encostado no fundo do mar e dois peixes ao seu redor.

Exemplar da família Dugongidae, o Dugong dugon (dugongo) . Fonte: Julien Willem/WikimediaCommons (CC BY-SA 3.0).



Imagem de um peixe-boi coberto com uma camada de musgo. Na parte inferior dele há vários peixes.

Exemplar da família Trichechidae. Fonte: PublicDomainImages/Pixabay (Domínio Público).



No Brasil, há ocorrência de Trichechus inunguis e T. manatus manatus, sendo o nosso país o único local do mundo onde há duas espécies de peixes-boi, apesar de não serem espécies exclusivas daqui. Uma pesquisa publicada em 2016 estimou que a abundância do peixe-boi-das-Antilhas, T. manatus manatus, no Brasil é em torno de 1104 indivíduos, podendo variar de 485 a 2221 indivíduos.


Na foz do rio Amazonas, na região da Ilha de Marajó, há uma área de hibridização por haver ocorrência do peixe-boi marinho no mesmo espaço do peixe-boi amazônico. Isso é uma situação delicada na questão da conservação, pois não permite que haja uma população mais “pura”: a hibridização impede que um indivíduo se reproduza com outro da mesma espécie, já que esse híbrido compete com a população original. Isso vai diminuindo cada vez a mais a variabilidade genética e a qualidade populacional. Existem desafios para solucionar esse problema da hibridização: há pouco conhecimento sobre o tamanho da população de híbridos e a extensão da área de ocorrência, além de haver necessidade de estudos a respeito do impacto desta população para as duas espécies de peixe-boi no Brasil e sobre a reprodução destes animais.


Segundo a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), o peixe-boi amazônico e o peixe-boi-das-Antilhas estão no estado de conservação “vulnerável”! Isso é preocupante, pois são espécies importantes para a manutenção do ecossistema aquático, além de participarem da continuidade dos serviços ecossistêmicos.



AMEAÇAS ANTRÓPICAS


A maior parte das ameaças são decorrentes de atividades humanas!


Caça predatória: a caça do peixe-boi reduziu em relação ao passado, contudo contribuiu bastante para o declínio do número de indivíduos.


Alimentação: áreas de capim-agulha vêm reduzindo devido à extração indiscriminada e insustentável do banco de algas e fanerógamas. Além disso, muitos cnidários vivem nesse meio, o que pode reduzir a palatabilidade do alimento dos peixes-boi, que podem até morrer por se alimentarem menos.


Poluição: o lixo nos oceanos interfere também na conservação destas espécies. Uma pesquisa realizada no nordeste do Brasil em 2015 encontrou indivíduos com ingestão de detritos plásticos.


Figura mostrado a poluição na praia. Várias garrafas pet, de vidro, lâmpada, pedaço de chinelo , entre outras coisas.

A poluição marinha é uma das maiores preocupações atuais, principalmente na questão de materiais plásticos. Fonte: John Cameron/Unsplash (Domínio Público).



Colisões: o aumento do tráfego das embarcações motorizadas traz também um grande risco para a conservação dos peixes-boi, pois afugenta estes animais, além de resultar em casos de colisões.


Imagem mostrando de cima o oceano e uma embarcação.

Rotas marinhas são potenciais regiões para haver colisões de embarcações com mamíferos aquáticos. Fonte: Johny vino/Unsplash (Domínio Público).



Portos: implantação de portos e uso de área costeira afugentam os peixes-boi para outras áreas, assim como diminuem sua área de alimentação.


Molestamento: a interação negativa do ser humano curioso com o animal pode criar vínculos de dependência com o homem, fazendo com que o animal não se comporte naturalmente no ambiente.


Outras ameaças antrópicas: perda e degradação de habitats; captura incidental em redes de pesca; vazamento de petróleo e gás; contaminação por hidrocarbonetos, metais pesados, pesticidas, organoclorados; áreas urbanas; turismo; áreas de recreação; comércio; aquacultura; rotas marinhas; mudanças climáticas.



O QUE FAZER?


Ações de conservação para reversão do quadro de ameaça ao peixe-boi, como: proteção de áreas de ocorrência; proteção de recursos alimentares e do habitat; manejo de área; restauração ambiental; educação ambiental; educação formal; treinamentos de profissionais da área; consciência e comunicação com a comunidade; regulamentação do setor privado; empresas alternativas de subsistência; financiamento para a conservação; turismo de observação/avistagens (pode ser fonte de renda para a comunidade local ao invés da caça); entre outros.


É necessário, também, investimento em mais pesquisas sobre: o tamanho da população, distribuição e migração; biologia e ecologia; ameaças das populações; plano de ação e recuperação das espécies; plano de gerenciamento baseado na área de ocorrência; ameaças da população humana e no habitat.


No Brasil já existem algumas ações de conservação que vêm ocorrendo, tanto para o peixe-boi amazônico, quanto para o peixe-boi marinho, como resgate, reabilitação, soltura, captura de nativos, monitoramento e pesquisas. Contudo, ainda está em construção e crescimento para melhorar o estado de conservação dessas espécies.



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Bibliografia


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