Autores: Aline Pereira Costa, Lucas Rodrigues da Silva, Fernanda Cabral, Raphaela A. Duarte Silveira e Douglas F. Peiró
Representação do fundo do mar na época da Gondwana, evidenciando a fauna marinha existente na região onde atualmente está localizado o estado de Minas Gerais. Fonte: © 2021 Douglas Cabral/Instituto Bióicos.
O Estado brasileiro de Minas Gerais é conhecido pela beleza de suas montanhas e cachoeiras, mas ninguém imagina que Minas Gerais já teve mar. Isso mesmo! Embora distante da região litorânea, Minas Gerais já foi banhado por um braço de mar raso há 500 milhões de anos atrás.
A DESCOBERTA
Evidências fósseis de animais marinhos do gênero Cloudina e Corumbella foram encontradas em paredões no município de Januária, região norte de Minas Gerais. A presença desses fósseis são provas irrefutáveis que, no passado, um braço de mar raso com no máximo 10 metros de profundidade, cobria esta região.
De acordo com os pesquisadores responsáveis pelo estudo, a hipótese é que esse braço de mar cobria não apenas essa região do território brasileiro, conhecido por Grupo Bambuí, mas também as porções leste da América do Sul, oeste da África e sul da Antártida (quando estes continentes ainda estavam unidos). E esse braço estava entre esses três continentes e se ligava ao oceano.
Sabe-se que há pouco mais de 500 milhões de anos, os crátons (blocos rochosos que constituem a crosta continental) tinham uma formação diferente da que hoje conhecemos. A América do Sul, a África e a Antártida eram ligadas entre si, formando o que conhecemos por Gondwana, que reunia a maior porção de terras hoje situadas no Hemisfério Sul.
Para os pesquisadores, a presença desse mar raso que inundou trechos da Gondwana é baseada na distribuição geográfica das Cloudina que também já foram encontradas na Namíbia, Omã e Paraguai. Além disso, eles acreditam que esse braço de mar tenha derivado do antigo Oceano Clymene.
Os fósseis encontrados estavam incrustados em um paredão e em alguns afloramentos constituídos de rochas da Formação Sete Lagoas, que faz parte do Grupo Bambuí, este por sua vez é uma das áreas sedimentares mais estudadas da América do Sul. Assim, o Bambuí é uma formação sedimentar da bacia do São Francisco, que se estende por aproximadamente 300 mil km² e abrange os estados de Minas Gerais, Bahia, Goiás, Tocantins e Distrito Federal.
Distribuição do Grupo Bambuí e limite do Cráton de São Francisco. Fonte: © 2021 Douglas Cabral/Instituto Bióicos.
A datação destes fósseis do Período Ediacarano varia de 635 a 541 milhões de anos atrás e representa um ponto de virada na história da vida, implica em uma conectividade oceânica intracontinental com as porções internas do cráton Congo-São Francisco. E devido a essa posição central do cráton é que o Grupo Bambuí se tornou uma das peças mais importantes para compreender a paleogeografia da Gondwana.
EVIDÊNCIAS BIOLÓGICAS
Os Cloudina foram os primeiros fósseis com esqueleto de carbonato de cálcio registrados no Período Ediacarano. Esses animais costumam ser classificados cnidários e possuem formato tubular composto por sucessões de cones calcários. Seu habitat era o assoalho de mares pouco profundos, ricos em gás carbônico e em faixas onde a luz atravessa a água.
Considerado na paleontologia como fóssil-guia (registros fósseis que podem ser encontrados em várias partes do mundo, mas sua ocorrência se restringe à um período de tempo bem definido), os Cloudina são usados para datar e correlacionar camadas geológicas, pois suas carapaças são frágeis, o que as tornam pouco resistentes. Diante disso, esses animais não poderiam ser capazes de sobreviver a um transporte intenso e contínuo de águas correntes. Devido a essa característica é que Cloudina é considerado originário da localidade onde foi encontrado e, baseado nesse fato é que os pesquisadores reforçam a ideia de que um mar raso banhava os locais onde esses fósseis são encontrados.
Corumbella e Cloudina, gêneros da fauna Ediacarano. Fonte: © 2021 Douglas Cabral/Instituto Bióicos.
Além dessas evidências que reforçam a presença de um mar onde hoje é o Estado de Minas Gerais, nesta mesma região os pesquisadores também encontraram fragmentos de Corumbella werneri, uma espécie marinha de cnidários, constituídos de um pólipo primário e um pólipo secundário capazes de sintetizar carapaças mineralizadas.
O fato é que, atualmente, Minas Gerais está bem distante do mar, mas, no passado, o estado fazia parte do ambiente marinho. Essa descoberta da ciência torna-se importante para que possamos datar as unidades geológicas encontradas nessa região do Estado, compreender a biogeografia do nosso planeta e entender a evolução dos animais.
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Bibliografia
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