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A maior bactéria marinha já encontrada: Thiomargarita namibiensis

Atualizado: 3 de ago. de 2022

Autores: Filipe Guilherme Ramos Costa Neves, Fernanda Cabral Jerônimo, Aline Pereira Costa e Douglas F. Peiró



Desenho colorido da bactéria Thiomargarita namibiensis, representada como bolinhas em fileira, dentro do sedimento de coloração esverdeada com a água representada na cor azul-rocheada.

Representação de populações de Thiomargarita namibiensis no sedimento em ressuspensão (em verde). As bactérias estão representadas por bolinhas brancas. H2S significa gás sulfídrico, NO3, nitrato e O2, gás oxigênio. Fonte: Denis Barthel/Wikimedia Commons (CC BY-SA 3.0).



Os micro-organismos são as formas de vida mais abundantes do planeta. Embora sejam pequenos em tamanho, sua importância para a manutenção da vida no planeta é imensa. São encontrados em todas as parte do oceano, seja nas regiões abissais, mesmo abaixo do sedimento, até as regiões entre-marés. Esses seres contribuíram muito para a evolução das espécies ao longo do tempo geológico. Quase todos os processos químicos realizados pelos organismos mais complexos também são realizados pelos micro-organismos. Além de serem produtores primários e servirem de alimento para algumas espécies, contribuem com a ciclagem de nutrientes no planeta.


Os procariontes são um grupo desses micro-organismos, apresentando uma forma de vida mais simples em termos de tamanho e estrutura celular. Também representam a forma mais rudimentar de vida existente no planeta Terra e são formados por células contendo parede celular, membrana plasmática e citoplasma. Porém, diferentemente dos eucariontes, eles não possuem núcleo definido, seu material genético é encontrado espalhado pelo citoplasma. Também não têm organelas membranosas, ou seja, envolvidas por uma bicamada de fosfolipídios. Existem dois tipos de procariontes: as bactérias e as arqueas, que se diferenciam bastante em termos moleculares.



A DESCOBERTA DA Thiomargarita namibiensis


Fotografia de uma parte da costa da Namíbia, onde foram encontradas populações de Thiomargarita namibiensis. O mar está à direita e a praia está em paralelo, com algumas casas e apartamentos à esquerda.

Imagem da costa da Namíbia, país onde foi encontrada a Thiomargarita namibiensis. Fonte: Arne Müseler/Wikimedia Commons (CC BY-SA 3.0).



A espécie de bactéria Thiomargarita namibiensis foi descoberta por uma aluna de doutorado alemã, Heide Schulz. Ela estava estudando bactérias sulfurosas na costa da Namíbia, um país ao sudoeste do continente africano. Analisando amostras de sedimento da plataforma continental, Schulz encontrou juntamente com os gêneros que estudava (Beggiatoa e Thioploca), bactérias muito grandes. A pesquisadora sabia que se tratava de uma nova espécie, pois não conhecia bactérias de tão grandes dimensões.


Schulz batizou a bactéria com o epíteto específico “namibiensis” devido à localização em que foi encontrada, na costa da Namíbia. A espécie pode chegar a 750 𝜇m (micrômetros) de diâmetro, mas normalmente tem entre 100 e 300 𝜇m. Em comparação a uma bactéria muito comum, como a Escherichia coli, a T. namibiensis teria o tamanho de uma baleia azul, enquanto a E. coli, o tamanho de um camundongo.


Para provar ser uma nova bactéria, Schulz teve que trabalhar bastante para convencer a comunidade científica da nova descoberta, como ela mesma afirmou.



MORFOLOGIA E FISIOLOGIA DA Thiomargarita namibiensis


Microfotografias de células de Thiomargarita namibiensis em formato de grandes esferas com várias pequenas esferas no seu interior, que são as inclusões de enxofre, muito comum nessa espécie.

Células de Thiomargarita namibiensis em processo de divisão celular. A e B demonstram células em um único plano de divisão. C apresenta as células em outros planos de divisão. As pequenas esferas no interior das células são inclusões de enxofre, muito comum na espécie. Fonte: Schulz, 2002/ASM NEWS.



Encontrada em abril de 1997, a T. namibiensis apresenta sua célula contendo inclusões de enxofre no seu interior. Ela apresenta um imenso vacúolo, que ocupa boa parte do citoplasma, deixando de 1 a 2 𝜇m livres. Por apresentar essas inclusões de enxofre, a célula de T. namibiensis tem um brilho esbranquiçado.


Além de acumular sulfetos em sua célula, a bactéria estoca em seu vacúolo o nitrato, que por exemplo, auxilia na formação de suas proteínas. Essa adaptação permite à bactéria viver em ambientes bentônicos, ou seja, próximo ao sedimento marinho, onde a coluna de água é escassa em nitrato e o sedimento quase não apresenta tal composto. Sendo assim, a T. namibiensis é o organismo bentônico mais dominante nos sedimentos da plataforma continental da Namíbia.


A pérola da Namíbia, como também é chamada a espécie, apresenta o hábito litotrófico, ou seja, realiza a oxidação do sulfeto livre no sedimento. Seus nutrientes podem inclusive ser adquiridos pela célula por difusão, devido ao seu citoplasma ser bem diminuto. A oxidação de compostos de sulfeto pode ocorrer mesmo na ausência de nitrato, como também na presença do ar atmosférico. Tal adaptação permite à bactéria sobreviver mesmo nessas condições desfavoráveis. Já foi observado que ela pode sobreviver por anos mesmo sem adição de nitrato no ambiente.


Um problema para a bactéria seria o fato do enxofre ser tóxico em altas concentrações. Mas ela estoca os compostos de sulfeto em uma forma não-tóxica e bem condensada, que lhe auxilia em tempos de escassez. Também, na ausência de nitrato, ela tem a capacidade de diminuir sua atividade metabólica.


A T. namibiensis não forma filamentos como os gêneros Beggiatoa e Thioploca, que são suas parentes, estando na mesma família taxonômica. A T. namibiensis produz um muco que envolve as células, que se mantêm unidas após a divisão celular. Outra diferença entre os gêneros é que a bactéria em questão não possui mobilidade como as outras e, então, depende da ressuspensão dos sedimentos da costa da Namíbia para aquisição dos nutrientes dos quais precisa.



A IMPORTÂNCIA DE Thiomargarita namibiensis PARA O ECOSSISTEMA BENTÔNICO


T. namibiensis tem como hábitat os sedimentos da costa da Namíbia, porém ela não é encontrada em todo o sedimento da plataforma, mas em locais cujos grãos são formados por restos de diatomáceas. Mais recentemente foi encontrada na costa mexicana uma segunda espécie do mesmo gênero, porém ainda está em fase de classificação.


A bactéria encontra em seu habitat um ambiente fluido e repleto de matéria orgânica, onde ocorre a redução de sulfato em sulfeto e sequestro desse nutriente pela bactéria. Desse modo, a bactéria contribui com o ciclo do enxofre de modo significativo, já que a abundância e biomassa de suas populações são grandes quando comparadas às outras bactérias sulfurosas.


Dois filamentos do gênero Beggiatoa, um emaranhado de sedimento e uma diatomácea penada sobre um fundo azul. Os filamentos apresentam pontinhos mais escuros e são em forma de fio, a diatomácea se apresenta como uma pena.

Filamentos de Beggiatoa sp. com partículas de sedimento e uma diatomácea. A Beggiatoa sp. é também encontrada em sedimentos, com Thiomargarita namibiensis. Fonte: Proyecto Agua/Flickr (CC BY-NC-SA 2.0).



Representantes do gênero Beggiatoa são encontrados em sedimentos com grandes concentrações de oxigênio e a partilha de habitat com outras espécies forma um gradiente, onde Beggiatoa fica localizada na superfície sedimentar, em maior contato com a atmosfera, enquanto Thiomargarita está localizada logo abaixo, no sedimento lamoso, seguido por Thioploca, presente mais ao fundo, em sedimentos mais sólidos.


T. namibiensis pode apresentar ainda um grande número de bactérias envoltas no seu muco. Tais bactérias são redutoras de nitrato, podendo auxiliar a bactéria na aquisição do nutriente, sendo este um exemplo de mutualismo entre os grupos.

Contudo, as adaptações de T. namibiensis, como seu hábito passivo, conferem à bactéria o tamanho que possui. Suas grandes populações e consequente alta produtividade fazem com que ela seja extremamente importante para o sustento da vida no bentos.




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Bibliografia


CASTRO, P. e HUBER, M. R. Capítulo 5: The Microbial World, 86-88 p. Em CASTRO, P. e HUBER, M. R. Marine Biology. 10. ed. New York: Mc Graw Hill, 2016. v. 10. p. 465.


LEITE, M. Estudo revela maior bactéria conhecida. A Folha de São Paulo, Ciência. 1999 Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe16049902.htm. Acesso em: 10 out. 2020.


SCHULZ, H. N. Thiomargarita namibiensis: Giant Microbe Holding Its Breath. ASM News, v. 68, n. 3, p. 122–127, 2002. Disponível em; https://www.researchgate.net/publication/256398005_Thiomargarita_namibiensis_Giant_microbe_holding_its_breath. Acesso em: 19 nov. 2020.


SCHULZ, H. N. The Genus Thiomargarita. Prokaryotes, v. 6, p. 1156–1163, 2006. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/225314349_The_Genus_Thiomargarita. Acesso em: 19 nov. 2020.












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