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Zonas de ressurgências no oceano

Atualizado: 1 de dez. de 2022

Autores: João Antonio C. Veloso, Raphaela A. Duarte Silveira, Thais R. Semprebom e Douglas F. Peiró



Imagem de satélite da costa da Califórnia com uma legenda de temperatura superficial do mar variando de 18 graus celsius (vermelho) até 10 graus celsius (azul) identificando uma zona de ressurgência através de baixas temperaturas.

Imagem de satélite da ressurgência da Califórnia, identificada pelas baixas temperaturas na costa. Em preto: continente; Colorido: variação de temperaturas no oceano. Fonte: NOAA/Ocean Explorer (Domínio Público).



A ressurgência, ou afloramento, é um fenômeno dos oceanos onde águas frias de profundidade sobem para a superfície do mar. Essas águas são ricas em nutrientes, que foram conservados pela falta de atividade fitoplanctônica (fotossíntese), devido à ausência da luz solar em zonas profundas na água e pela decomposição de organismos, que gera nutrientes.


Os eventos de ressurgência estão associados a vários fatores, mas um dos principais é com a incidência de ventos nos oceanos. Ao encontrar a superfície do mar, o vento provoca o deslocamento das águas de superfície para Norte-Sul no caso da ressurgência equatorial ou Leste-Oeste dependendo da sua direção e posição do continente, possibilitando a subida das águas de profundidade. Essa dinâmica é chamada de Transporte Superficial de Ekman.


As zonas de ressurgência são responsáveis por afetar a produtividade primária dos oceanos em uma escala global. Elas se caracterizam por sua alta produtividade primária, que sustenta uma grande biodiversidade de animais marinhos. Apesar de representarem uma pequena parcela da superfície dos oceanos, esses eventos abrangem um dos maiores potenciais de pescado do mundo. Aproximadamente 25% da pesca global são capturadas em cinco áreas de ressurgência ao longo do planeta, ocupando apenas 5% da superfície total dos oceanos.



TIPOS DE RESSURGÊNCIA:


- Ressurgência Costeira


A ressurgência costeira ocorre em virtude da incidência de ventos ao longo da margem do continente, ou seja, paralela à linha de costa. Um evento de ressurgência costeira nem sempre permanece durante o ano inteiro, mas apenas durante as estações que proporcionam correntes de vento na direção correta.



Ilustração da zona costeira com ventos ao longo da margem do continente indicados por três setas azuis largas ocasionando o deslocamento de águas de superfície indicado por uma seta vermelha e a subida de águas profundas, frias e ricas em nutrientes através de setas pretas. Também é destacado a presença de fitoplâncton e zooplâncton na superfície onde as águas profundas ressurgem.

Ilustração do evento de ressurgência costeira diante dos ventos paralelos à linha de costa que deslocam águas de superfície, causando a subida de águas profundas ricas em nutrientes que, em contato com a luz solar, favorece a proliferação do plâncton marinho. Fonte: adaptado de NOAA/Wikimedia Commons (CC0).



Os ventos de ressurgência costeira ocorrem frequentemente na borda leste dos oceanos (ou costa oeste dos continentes), como no caso da ressurgência do Peru, da Califórnia e do sudoeste da África. Porém, casos raros de ressurgência costeira na borda oeste dos oceanos também existem; e são consequências de fatores únicos, como os ventos de monções (fenômeno climático decorrente de variações de temperatura no ar) no sistema de ressurgência Somália-Arábia.



A figura retrata toda a superfície do planeta Terra com destaque para áreas de ressurgência costeira marcadas de vermelho.

Representação das áreas de ressurgência costeira pelo mundo, marcadas em vermelho. Fonte: Carl Resler/Green Sea Upwelling ®.



No Brasil, a cidade de Cabo Frio/RJ também recebe eventos de ressurgência em sua costa. Eles ocorrem sazonalmente entre a primavera e verão, devido à geomorfologia íngreme da plataforma continental, direção da costa e predominância de ventos em direção nordeste.



- Ressurgência Equatorial


A ressurgência equatorial ocorre em toda a extensão da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) sobre os oceanos, como consequência do corredor de ventos alísios.


Mas o que são os ventos alísios? São ventos predominantes de leste (ou seja, vêm de leste e vão para oeste) da Linha do Equador, direcionados pelas zonas subtropicais. Esses ventos fazem parte do movimento em larga escala da atmosfera, denominado Circulação Geral da Atmosfera (CGA), gerada pelo aquecimento da superfície terrestre e da rotação do planeta.



Imagem de satélite da zona equatorial no oceano pacífico com concentração de clorofila a. Na figura também é mostrado o padrão de ventos alísios de nordeste e sudeste através de setas pretas provocando o deslocamento de águas de superfície saindo da zona equatorial em direção ao sul e norte do oceano representado por setas vermelhas causando concentrações altas (cores próximas ao vermelho) de clorofila a durante a faixa equatorial do oceano pacífico.

Imagem de satélite mostrando a concentração do pigmento fotossintético clorofila a, em mg/m3,na zona equatorial do Oceano Pacífico. Ela revela o evento de ressurgência diante do padrão de ventos alísios que sopram as águas quentes de superfície. Fonte: adaptado de NASA/Wikimedia Commons (CC0).



Basicamente, a incidência de raios solares sobre a superfície da Terra gera excesso de calor em baixas latitudes (próximas à linha do equador) e deficiência em altas latitudes (próximas aos pólos). Isso causa movimento de massas de ar frio e denso das áreas mais frias (Polos Norte e Sul) em direção à área mais quente (Linha do Equador). Entretanto, esse movimento do ar frio para a Linha do Equador não segue uma direção uniforme. Quando a Terra gira em torno de seu próprio eixo de Oeste para Leste, a sua atmosfera corresponde a essa rotação, alterando a direção das correntes de ventos, como uma resposta à chamada Força de Coriolis. Assim, formam-se os ventos alísios e os demais tipos de ventos componentes da CGA.



Desenho esquemático da circulação geral da atmosfera. Um círculo representa o planeta Terra, linhas representam os paralelos e setas representam correntes de ventos. Na figura, setas vermelhas em direção à Linha do Equador indicam os ventos alísios de nordeste e sudeste se encontrando na zona de convergência intertropical que separa o hemisfério norte e hemisfério sul. Setas verdes indicam ventos de oeste, indo dos polos para paralelos de alta latitude. Setas azuis indicam ventos de leste, indo de regiões de latitudes intermediárias para latitudes maiores.

Representação esquemática das principais correntes de ventos da Circulação Geral da Atmosfera (CGA) e da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT). Fonte: adaptado de Reboita S. M. et al./Researchgate (CC BY-NC 4.0).



Dessa forma, quando os ventos alísios passam pela superfície dos oceanos, há uma divergência das águas de superfície para os lados esquerdo e direito da direção dos ventos, que ocasiona a subida de águas profundas, registrando a ressurgência equatorial.



- Ressurgência da Antártica


O continente da Antártica também experimenta ressurgência em sua costa, com as águas vindas de todos os oceanos, principalmente do Atlântico Sul. Além disso, a região da Antártica é rodeada pela Corrente marítima Circumpolar Antártica (CCA), a corrente mais veloz dos oceanos, que facilita o regime de ressurgência ao ajudar as águas de ressurgência a contornar o continente.



A figura mostra um modelo tridimensional do Oceano Austral com o continente antártico e toda sua topografia de fundo em branco e com as águas de ressurgência ao redor do continente antártico marcadas de azul.

Modelo tridimensional da Antártica, com destaque para as águas de ressurgência em azul. Fonte: Tamsitt et al. (CC BY).



O afloramento do Oceano Antártico ocorre com os ventos de oeste da Circulação Geral da Atmosfera que circunda o continente e sopra as águas de superfície para longe da costa. Contudo, não apenas os ventos, mas outros fatores principais favorecem a ressurgência de águas de profundidades tão elevadas nesta região. A topografia ao redor do continente Antártico, que apresenta montes submarinos agindo como uma ‘‘escada em espiral’’ para as águas ressurgirem, além dos vórtices, redemoinhos oceânicos, que também favorecem a subida das águas e impedem que essas parcelas de águas profundas escapem da Corrente Circumpolar Antártica, são alguns desses fatores.


Pode-se dizer que o regime de ressurgência da Antártica é a principal responsável pelos nutrientes que os organismos da superfície utilizam para sobreviver, além de possibilitar uma desgaseificação de dióxido de carbono, antes estocado no oceano profundo, para a atmosfera. Dessa forma, mudanças nesse regime podem provocar alterações não apenas no ambiente marinho, mas na regulação de dióxido de carbono no mundo.



Sendo assim, as zonas de ressurgência mostram-se como importantes provedoras de nutrientes em meio oceânico, promovendo uma proliferação de microalgas (fitoplâncton), que sustentam uma quantidade expressiva de outros organismos (ex.: zooplâncton), até chegar no pescado e de outros animais marinhos de topo de cadeia trófica.


No entanto, apesar da grande biodiversidade resultante da ressurgência, estas áreas hoje são sensíveis às mudanças climáticas, que podem deixá-las menos frequentes, mais fortes e longas em duração. Portanto, em longo prazo, os eventos de ressurgência que possam sobreviver às mudanças climáticas podem se tornar tóxicos aos organismos marinhos, devido ao excesso de metais oriundos de águas profundas, onde o limite entre micronutrientes e toxicidade é ínfimo, sendo necessária atenção para esses ambientes, importantes na dinâmica dos oceanos.




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BIbliografia


AYOADE, J. O. Introdução à Climatologia para os Trópicos. 4. ed. Rio Branco: Bertrand Brasil S.a., 1996. 80 p.


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LALLI, C. M. et al. BIOLOGICAL OCEANOGRAPHY: an introduction. 2. ed. Vancouver: Elsevier Science, 1997. 63 p.



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