top of page

A evolução dos cérebros dos cefalópodes

Autores: Maria Eduarda Barbosa, Filipe Guilherme Ramos Costa Neves e Raphaela A. Duarte Silveira


Montagem com 6 fotos de vários cefalópodes. Na imagem (A) vemos um polvo-comum, Octopus vulgaris em seu habitat natural; Na imagem (B) vemos uma lula-repolho, Sepioteuthis sepioidea de corpo alongado e uma coloração manchada; Na imagem (C) vemos uma sépia-comum ou choco, Sepia officinalis  exibindo sua característica concha interna e corpo em forma de lança, com tentáculos visíveis na parte frontal.; Na imagem (D) vemos detalhes da concha e os tentáculos curtos ao redor do olho de um náutilo, Nautilus pompilius; Em (E)  vemos o fóssil de um belemnito, Clarkeiteuthis conocauda, um cefalópode extinto de corpo alongado. É possível observar vestígios de seus tentáculos preservados na rocha; Em (F) vemos o fóssil de um amonite, Orthosphynctes, outro cefalópode extinto, com sua concha em espiral bem preservada.

(A) Polvo-comum, Octopus vulgaris em seu habitat natural; (B) lula-repolho, Sepioteuthis sepioidea; (C) sépia-comum ou choco, Sepia officinalis; (D) náutilo, Nautilus pompilius; (E) fóssil de um belemnito, Clarkeiteuthis conocauda, um cefalópode extinto e (F) fóssil de um amonite, Orthosphynctes, outro cefalópode extinto. Fonte: Wikimedia Commons (CC0).



Você consegue imaginar um invertebrado com um cérebro grande e complexo? Sim, existe! Os primeiros cefalópodes conhecidos datam do Cambriano, há mais de 490 milhões de anos. Desde o Cambriano até hoje, esses animais passaram por transformações que moldaram suas características únicas e sua adaptação aos ambientes marinhos.


A primeira grande modificação estrutural foi a internalização da concha, permitindo não apenas maior mobilidade e agilidade, como também o desenvolvimento de habilidades cognitivas mais avançadas em muitos cefalópodes modernos, como polvos, lulas e chocos.


Atualmente, os cefalópodes são classificados em dois principais grupos: Coleoidea (coleóides) e Nautiloidea (nautilóides). Os coleóides são divididos em octopodiformes de oito braços (polvos e lulas-vampiros) e decapodiformes de dez braços (lulas e chocos), caracterizados por sua flexibilidade corporal, cérebros altamente desenvolvidos e, frequentemente, a ausência de conchas externas. Por outro lado, os nautilóides (como o náutilo e náutilo-de-pergaminho) são caracterizados pela presença de conchas externas espiraladas, uma estrutura de câmaras internas para flutuação e uma organização menos complexa do sistema nervoso central.


Ilustração de uma lula-vampiro. A criatura é mostrada em um fundo claro, destacando seu corpo escuro e translúcido, com grandes olhos esféricos e barbatanas laterais que lembram orelhas de morcego. Seus tentáculos, finos e curtos, são visíveis na parte inferior do corpo.

A lula-vampiro, Vampyroteuthis infernalis, é uma verdadeira maravilha das profundezas oceânicas. Adaptada à escuridão do fundo do mar, ela mostra como a evolução dos cefalópodes criou seres surpreendentes, capazes de sobreviver e prosperar em ambientes extremos. Fonte: Carl Chun/Wikimedia Commons (CC0).



GENOMA DO POLVO


Um estudo do genoma do polvo identificou adaptações moleculares específicas que resultaram no desenvolvimento de sistemas nervosos altamente complexos nos cefalópodes. Esses sistemas são essenciais para comportamentos sofisticados, como a camuflagem, onde o polvo muda de cor para se esconder dos predadores, e o reconhecimento de padrões, que permite aos cefalópodes identificar presas e predadores, fundamentais para a sobrevivência e reprodução desses animais em seu habitat.


O estudo destacou como genes específicos interagem com o ambiente para formar características neurais complexas, como a capacidade de resolver problemas e lembrar soluções. Essas adaptações não apenas ilustram a plasticidade e adaptabilidade evolutivas dos cefalópodes como também oferecem perspectivas valiosas para entender como a evolução molecular pode moldar a diversidade e complexidade dos sistemas nervosos em diferentes linhagens de animais.



TIPOS DE CÉREBRO E EVOLUÇÃO NO SISTEMA NERVOSO CENTRAL


Pesquisadores caracterizaram as regiões cerebrais de 52 espécies de cefalópodes e identificaram dez "cerebrotipos" distintos, evidenciando a adaptação dos cefalópodes a nichos ecológicos específicos. Essa variação cerebral é comparável àquela encontrada em vertebrados e destaca como esses invertebrados desenvolveram estratégias sensoriais e computacionais únicas para prosperar em diversos ambientes oceânicos.


As descobertas sugerem que a evolução dos cérebros dos cefalópodes é impulsionada por um conjunto de fatores filogenéticos e adaptações a diferentes estilos de vida. Esses fatores se relacionam com estratégias de sobrevivência em diferentes habitats, indicando a complexidade e plasticidade neuroanatômica desses animais.


Os cefalópodes coleoides existentes apresentam comportamentos extraordinariamente sofisticados, incluindo resolução de problemas complexos, discriminação condicional dependente de tarefas, aprendizado observacional e exibições admiráveis de camuflagem.


O cérebro dos cefalópodes se assemelha ao cérebro dos vertebrados em termos de tamanho relativo e complexidade. Diversas visões atuais sobre a evolução da cognição complexa sugerem que a inteligência coevoluiu em animais com histórias de vida lentas em resposta a determinados desafios socioecológicos. Com as descobertas recentes sobre a cognição dos cefalópodes, despertou o interesse científico na senciência desses animais. Tais descobertas são importantes porque nossa percepção do bem-estar de um animal está intimamente ligada à forma como percebemos suas capacidades cognitivas e emocionais.


Estas adaptações neuroanatômicas evidenciam a extraordinária capacidade dos cefalópodes de se ajustarem a ambientes diversos e desafiadores, demonstrando a complexidade evolutiva desses animais invertebrados.


Na imagem, vemos uma mulher observando atentamente um polvo. Ela está posicionada de forma a destacar a interação próxima com o polvo, mostrando interesse e admiração pela habilidade de camuflagem do animal.

A camuflagem é uma habilidade do polvo que só se tornou possível graças à evolução do seu sistema nervoso. Fonte: Gil Koplovitz/Wikimedia Commons (CC BY-SA 3.0).



CEFALÓPODES, MUDANÇAS CLIMÁTICAS E PERSPECTIVAS FUTURAS


Enquanto os cefalópodes têm demonstrado uma notável capacidade de adaptação ao longo de milhões de anos, as mudanças climáticas contemporâneas apresentam novos desafios para essas espécies.


Outro estudo explorou como a diversidade de cefalópodes costeiros distribuídos globalmente são afetados pelas mudanças climáticas e projetou cenários futuros. A pesquisa mostrou que a região do Indo-Pacífico Central, especialmente o Mar da China Oriental e o Leste das Filipinas, é um hotspot de diversidade dessas espécies. Observou-se também que cefalópodes maiores são encontrados em latitudes mais altas, seguindo a regra de temperatura-tamanho.


Contudo, a previsão é de que, até o fim do século, 96% das espécies de cefalópodes enfrentarão uma redução de suas áreas de ocupação, e 15% perderão totalmente seu habitat, além de um aumento do tamanho corporal em 44% em altas latitudes e, em contrapartida, uma redução de 37% do tamanho corporal em regiões tropicais.


Esses dados indicam a vulnerabilidade dos cefalópodes às alterações climáticas. Enquanto países em latitudes mais altas podem se beneficiar do aumento no tamanho dos cefalópodes, as regiões tropicais enfrentarão desafios significativos. Portanto, é essencial que estudos como esse sejam realizados para entender como as mudanças ambientais afetam os ecossistemas marinhos, pois os cefalópodes, assim como qualquer outro ser vivo, têm sua importância na cadeia trófica e na manutenção do ambiente marinho.




Bibliografia


ALBERTIN, C. B.; KATZ, P. S. Evolução dos sistemas nervosos dos cefalópodes. Curr Biol., v. 33, n. 20, p. 1087-1091. 2023. DOI: https://doi.org/10.1016/j.cub.2023.08.092


ALBERTIN, C. B. et al. O genoma do polvo e a evolução das novidades neurais e morfológicas dos cefalópodes. Nature. v. 524 , p. 220–224. 2015. DOI: https://doi.org/10.1038/nature14668


BOAVIDA-PORTUGUAL, J. et al. Global Patterns of Coastal Cephalopod Diversity Under Climate Change. Frontiers in Marine Science, v. 8. 2021. DOI: https://doi.org/10.3389/fmars.2021.740781


PONTE, G. et al. Cerebrotypes in Cephalopods: Brain Diversity and Its Correlation With Species Habits, Life History, and Physiological Adaptations. Front Neuroanat., v. 14, vol. 14: 565109. 2020. DOI: 10.3389/fnana.2020.565109


SCHNELL, A. K.; CLAYTON, N.S. Cephalopods: Ambassadors for rethinking cognition. Biochemical and Biophysical Research Communications, v. 564, p. 27-36. 2021. DOI: https://doi.org/10.1016/j.bbrc.2020.12.062.

Faça parte!

Contribua com o Projeto Bióicos para a continuidade de nossas produções voluntárias, como: Revista, Poscast, Youtube e Instagram

Assine a lista e receba as novidades!

Obrigado pelo envio! Verifique seu e-mail e marque-nos como contato seguro!

Projeto Bióicos©
Todos os direitos reservados
bottom of page