15 de ago de 20214 min
Atualizado: 4 de fev de 2022
Autores: José Pedro Vieira Arruda Júnior, Nicholas Negreiros, Thais R. Semprebom, Raphaela A. Duarte Silveira e Douglas F. Peiró
O coral-sol é uma espécie exótica invasora que ameaça a biodiversidade marinha brasileira (Ilha da Âncora, Búzios). Fonte: Maraguary/Wikimedia Commons (CC0).
A intensificação do trânsito marítimo, desde as grandes navegações, permitiu que organismos fossem transferidos para áreas que não sejam de sua ocorrência natural. Esses organismos são chamados de espécies exóticas e podem causar grandes problemas ecológicos e econômicos no ambiente em que são encontrados, como é o caso do coral-sol (Tubastraea spp.).
O QUE SABEMOS SOBRE O CORAL-SOL?
Coral-sol é o nome comum para espécies animais do gênero Tubastraea, originários do Indo-Pacífico e que chegaram ao Brasil por volta dos anos 1980, em incrustações de plataformas petrolíferas no Rio de Janeiro. No Brasil, são encontradas duas espécies, T. tagusensis, de cor amarelada, e T. coccinea, de cor alaranjada (entre outras características morfológicas que as distinguem), tanto em ambientes naturais da costa brasileira como também em plataformas petrolíferas, navios e bóias. Esses organismos estão se dispersando na costa do Brasil, mas principalmente nos estados de Santa Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia, e mais recentemente em outras áreas do Nordeste, como Pernambuco e Ceará.
MAS COMO ESSAS ESPÉCIES CONSEGUIRAM SE ESTABELECER NO BRASIL?
Quando uma espécie consegue ser uma boa competidora por espaço, ela pode exercer influência ao longo de uma área e ter vantagem na competição com outros organismos que não sejam de sua espécie (competição interespecífica). Além disso, uma maior área de influência possibilita que a espécie exótica tenha maior disponibilidade de recursos para crescer e se reproduzir. A ausência de predadores naturais também intensifica a área de influência desses organismos. Todas essas características podem favorecer a espécie de tal forma que ela se torne invasora no local.
O coral-sol possui características que o torna um excelente competidor por espaço e por recursos. Por exemplo, não precisa de zooxantelas (microalgas) para realizar fotossíntese e, por isso, não branqueiam como os corais zooxantelados. Além disso, possui altas taxas de reprodução (sexuada e assexuada), principalmente em águas quentes, onde o seu metabolismo é acelerado.
A reprodução desse organismo acontece por meio da dispersão de uma larva pelágica (plânula) que, devido à capacidade de natação e de dispersão, consegue se estabelecer como pólipos em áreas distantes da sua área de liberação. Além disso, esses organismos produzem substâncias químicas que impedem o assentamento (estabelecimento da larva em um substrato) das suas larvas próximas da área de liberação (alelopatia), obrigando essas larvas a buscarem áreas distantes da influência desses compostos químicos. Assim, o coral-sol consegue aumentar a sua área de distribuição no Brasil.
O coral-sol (A) e seus estágios iniciais de desenvolvimento como embrião (B), larva evidenciando seu poro oral (C) e larva madura (D). Fonte: adaptado de Luz et al. (2020) (CC BY 4.0).
QUAIS SÃO OS PREJUÍZOS ECONÔMICOS E ECOLÓGICOS DA INVASÃO DO CORAL-SOL?
Na Bahia, o coral-sol compete com o coral-cérebro (Mussismilia braziliensis), que é a espécie mais encontrada nos recifes e chapeirões de Abrolhos. Como o primeiro se reproduz e cresce mais rápido, o segundo sucumbe a esse excelente competidor. Assim, as estruturas que conhecemos dos chapeirões nos recifes da Bahia estão ameaçadas. Além disso, esponjas e algas, que também compõem e formam recifes no Brasil, vão sendo sufocadas pelo coral-sol à medida que estes crescem e acabam homogeneizando os recifes.
Dessa forma, a biodiversidade dos recifes brasileiros reduz drasticamente, já que espécies que antes habitavam ali acabam desaparecendo pela falta de recursos e condições para se estabelecer. O coral-sol pode transformar ambientes recifais e afetar negativamente atividades econômicas, como a pesca local e o ecoturismo subaquático.
O QUE PODE SER FEITO PARA CONTROLAR AS POPULAÇÕES DE CORAL-SOL NO BRASIL?
É importante sempre que haja a união da sociedade, da academia e de instituições públicas e privadas na luta contra espécies exóticas para a construção de um plano de ação adequado à realidade de cada região.
O plano de ação segue protocolos compostos pelo diagnóstico e monitoramento, onde são conhecidas as características biológicas e ecológicas desses organismos, além de sua distribuição no Brasil. Depois, são compiladas formas de controle e manejo que já existem, juntamente com projetos desenvolvidos pelo Poder Público e Privado no Brasil:
Controle químico, com substâncias específicas para as espécies e não cumulativas, ou seja, que não se acumulam nos organismos marinhos.
Controle físico, com a remoção mecânica.
Controle biológico, que acontecem por meio da introdução de parasitos específicos da espécie, predadores e/ou melhores competidores. No entanto, esse controle não é tão bem aceito, pois pode introduzir outras espécies exóticas.
Financiamento de pesquisas em Universidades Públicas e Instituições Privadas para desenvolvimento de planos de ações para o manejo do coral-sol em diversas regiões do país e para a sensibilização e educação ambiental em comunidades tradicionais que estão sendo afetadas negativamente pela presença do coral (ex.: Projeto Coral Sol e outros projetos desenvolvidos).
O mergulho é a principal forma de acesso às colônias de coral-sol para sua remoção (Mergulhadores Felinto Perry, Dezembro de 2013) Fonte: Marinha do Brasil/Wikimedia Commons (CC BY-SA 2.0)
Assim, embora as espécies de coral-sol causem problemas ecológicos e econômicos na costa brasileira, existem diversas instituições que atuam no controle e manejo dessas espécies em conjunto para que possamos suprimir essa invasão, principalmente em áreas marinhas protegidas que são centros da biodiversidade marinha brasileira.
Bibliografia
Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA). Controle e monitoramento Plano Nacional de Prevenção, Controle e Monitoramento do Coral-Sol (Tubastraea spp.) no Brasil, 2018. E-book. Disponível em: https://www.icmbio.gov.br/esectamoios/images/stories/2019-08-02-Plano-Nacional-de-Prevencao-Controle-e-Monitoramento-do-Coral-sol-Tubastraea-spp-no-Brasil.pdf. Acesso em: 20 Jun. 2020.
LUZ, B. L. P et al. Life‐history traits of Tubastraea coccinea: Reproduction, development, and larval competence. Ecology and Evolution, v. 10, p. 6223–6238, 2020. Disponível em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/pdf/10.1002/ece3.6346. Acesso em: 20 Jun. 2020.
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